A NATUREZA COMO FONTE DE RECOMPOSIÇÃO ENERGÉTICA
Livro Os Mensageiros
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Entre árvores
Decorridos
alguns minutos, atingíamos pequena propriedade rural, povoada de arvoredo
acolhedor.
Laranjeiras
em flor perdiam-se de vista. Bananeiras estendiam-se em leque, enquanto o
goiabal, de longe, semelhava-se a manchas fortes de verdura. A relva macia
convidava ao descanso. E o vento calmo passava de leve, sussurrando alguma
coisa através da folhagem.
Aniceto
respirou a longos haustos, e falou:
— Os desencarnados, embora não se fatiguem como as
criaturas terrestres, não prescindem da pausa de repouso. Em geral, nossas
operações, ànoite, são ativas e laboriosas. Apenas um terço dos companheiros
espirituais, em serviço na Crosta, conserva-se em atividade diurna.
E,
notando-nos a curiosidade justa, sentenciou:
— Aliás,
isto é razoável. O dia terrestre pertence, com mais propriedade, ao serviço do
Espírito encarnado, O homem deve aprender a agir, testemunhando compreensão
das leis divinas. Pelo menos durante certo número de horas, deve estar mais só
com as experiências que lhe dizem respeito.
Nosso
instrutor amigo sorriu e observou:
— O dia e a noite constituem, para o
homem, uma folha do livro da vida. A maior parte das vezes, a criatura escreve
sozinha a página diária, com a tinta dos sentimentos que lhe são próprios, nas
palavras, pensamentos, intenções e atos, e no verso, isto é, na reflexão
noturna, ajudamo-la a retificar as lições e acertar as experiências, quando o
Senhor no-lo permite.
Calando-se
o nosso orientador, tivemos a atenção exclusivamente voltada para a beleza
circundante. Aquele campo amigo e hospitaleiro caracterizava-se por ambiente
muito diverso. Não mais as emanações pesadas da cidade grande, mas o vento
leve, embalsamado de suavíssimos perfumes. Refletia eu na bondade do Senhor,
que nos oferecia recursos novos, quando Aniceto voltou a dizer:
— A Natureza nunca é a mesma em toda parte. Não há duas porções de terra
com climas absolutamente iguais. Cada colina, cada vale, possui expressões
climatéricas diferentes. É forçoso reconhecer, porém, que o campo, em qualquer
condição, no círculo dos encarnados, é o reservatório mais abundante e vigoroso
de princípios vitais. Em geral, todos nós, os cooperadores espirituais, estimamos
o ar da manhã, quando a atmosfera permanece igualmente em repouso, isenta dos
glóbulos de poeira convertidos em microscópicos balões de bacilos e de outras
expressões inferiores. Entretanto, os trabalhos de hoje não nos permitiram o
descanso mais cedo...
Apoiamo-nos
no veludoso relvado, e, percebendo-nos a sêde de saber, Aniceto prosseguiu:
— Assim me explico, porque na floresta temos uma
densidade forte, pela pobreza das emanações, em vista da impermeabilidade ao
vento. Aí, o ar costuma converter-se em elemento asfixiante, pelo excesso de
emissões dos reinos inferiores da Natureza. Na cidade, a atmosfera é compacta
e o ar também sufoca, pela densidade mental das mais baixas aglomerações
humanas. No campo, desse modo, temos o centro ideal...
Indicando,
prazeroso, as frondes balouçantes, acentuou:
— Reina
aqui a paz relativa e equilibrada da Natureza terrestre. Nem a selvageria da
mata virgem, nem a sufocação dos fluidos humanos, O campo é nosso generoso
caminho central, a harmonia possível, o repouso desejável.
Embalados
ao pio de algumas juritis solitárias, repousamos algumas horas, magnificamente
asilados no templo da Natureza.
Com as
primeiras tonalidades do crepúsculo, Ãniceto nos convidou a passeio rápido
pelas imediações.
Reconhecia
que estávamos muito mais bem dispostos.
— Sàmente
depois de nos locomovermos por alguns minutos, observei que nas vizinhanças
havia grande quantidade de trabalhadores espirituais.
Em face
das minhas interrogações, nosso mentor explicou, bondosamente:
— O campo
é também vasta oficina para os serviços de nossa colaboração ativa.
E
apontando os servidores, que iam e vinham, considerou:
— O reino
vegetal possui cooperadores numerosos. Vocês, possívelmente, ignoram que
muitos irmãos se preparam para o mérito de nova encarnação no mundo, prestando
serviço aos reinos inferiores, O trabalho com o Senhor é uma escola viva, em
toda parte.
Nesse
momento, nossa atenção foi atraida por significativo movimento na estrada
próxima.
Dirigimo-nos
para lá, seguindo os passos de Aniceto, que parecia adivinhar o acontecimento.
Observei,
então, um quadro interessante: um homem jazia por terra, numa poça de sangue,
ao lado de pequeno veículo sustentado por um muar impaciente, dando mostras de
grande inquietação. Dois companheiros encarnados prestavam socorro ao ferido, apressadamente.
“É preciso conduzi-lo à fazenda sem perda de tempo”, dizia um deles, aflito,
“temo haja fraturado o crânio.” O número de d•esencarnados que auxiliava o
pequeno grupo, todavia, era muito grande.
Um amigo
espiritual que me pareceu o chefe, naquela aglomeração, recebeu Aniceto e a nós
com deferência e simpatia, explicou rapidamente a ocorrência. O carroceiro
havia recebido a patada de um burro e era necessário socorrer o ferido.
Serenada
a situação, vi o referido superior hierárquico chamar um guarda do caminho,
interpelando:
— Glicério, como permitiu semelhante acontecimento?
Este trecho da estrada está sob sua responsabilidade direta.
O subordinado, respeitoso, considerou sensatamente:
— Fiz o possível por salvar este homem, que,
aliás, é um pobre pai de família. Meus esforços foram improfícuos, pela
imprudência dele. Há muito procuro cercá-lo de cuidados, sempre que passa por
aqui; entretanto, o infeliz não tem o mínimo respeito pelos dons naturais de
Deus. É de uma grosseria inominável para com os animais que o auxiliam a ganhar
o pão. Não sabe senão gritar, encolerizar-se, surrar e ferir. Tem a mente fechada
às sugestões do agradecimento. Não estima senão a praga e o chicote. Hoje,
tanto perturbou o pobre muar que o ajuda, tanto o castigou, que pareceu mais
animalizado... Quando se tornou quase irracional, pelo excesso de fúria e
ingratidão, meu auxílio espiritual se tornou ineficiente. Atormentado pelas
descargas de cólera do condutor, o burro humilde o atacou com a pata. Que
fazer? Minha obrigação foi cumprida...
O Superior, que ouvia atenciosamente as alegações,
respondeu sem hesitar:
— Tem razão.
E como
dirigisse o olhar a Aniceto, desejando aprovação, nosso orientador afirmou:
— Auxiliemos o homem, quanto esteja em nossas
mãos, cumpramos nosso dever com o bem, mas não desprezemos as lições. Esse
trabalhador imprudente foi punido por si mesmo. A cólera é punida por suas
conseqüências. Ao mal segue-se o mal. Se os seres inferiores, nossos irmãos no
grande lar da vida, nos fornecem os valores do serviço, devemos dar-lhes, por
nossa vez, os valores da educação. Ora, ninguém pode educar odiando, nem
edificar algo de útil com a fúria e a brutalidade.
E,
indicando o grupo que conduzia o ferido a uma casa próxima, concluiu,
imperturbável:
— Como homem comum, nosso pobre amigo sofrerá
muitos dias, chumbado ao leito; entre as aflições dos familiares, demorar-se-á
um tanto a restabelecer o equilíbrio orgânico; mas, como Espírito eterno,
recebeu agora uma lição útil e necessária.
Altamente
surpreendido, reparei na grande serenidade do nosso orientador e comecei a
compreender que ninguém desrespeita a Natureza sem o doloroso choque de
retorno, a todo tempo.
OS MENSAGEIROS
FRANCISCO CÂNDIDO XAVIER
DITADO PELO
ESPÍRITO ANDRÉ LUIZ
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